Não há dinheiro, não há palhaçadas.

Tal como eu previ há umas semanas, os esqueletos maiores do caso BES ainda não tinham saído do armário. Esperava até que demorasse um pouco mais. Mas, na semana passada, a detenção de Ricardo Salgado, há mais de duas décadas a comandar os destinos do banco, veio mostrar que afinal os peixes-graúdos já não fogem tão rápido como antigamente. Esta semana quero recordar o outro lado da queda da Família Espírito Santo levada pelos negócios ruinosos que construíram e que suportavam vidas de luxo até agora. Não é surpresa para ninguém que política e economia sempre andaram de mãos dadas. Seja em cargos saltitantes da Assembleia da República e dos partidos para os gabinetes da banca e vice-versa. Quanto aos partidos, soubemos também pela imprensa deste fim-de-semana que nenhum pode atirar a primeira pedra porque todos têm telhados de vidro e fáceis de quebrar. O BES emprestou, nos últimos anos, muito dinheiro ao PS, PSD, CDS e PCP, tendo o partido de Paulo Portas sido o mais bem pago, num valor que ascende a cinco milhões e meio de euros. O BES assumia-se como o banco de todos os regimes, desde o tempo da República ao Estado Novo passando depois a ter o mesmo poder de influência já na Era democrática. O banqueiro que agora terá de pagar uma caução de três milhões de euros pela liberdade, estava ligado a quase todas as áreas do país e influenciava, como poucos, os governos em cada momento. A nega que levou recentemente de Pedro Passos Coelho é inédita, já que, pela primeira vez, um primeiro-ministro resolveu não ajudar o «Dono Disto Tudo», como era conhecido Ricardo Salgado nos meandros do poder. Uma coisa é certa: o BES não voltará a ser o mesmo, mas a verdade é que quando não há dinheiro, como é o caso de Portugal, o poder político deixar de ser comandado pelo poder financeiro e económico. Quando não há dinheiro, não há vícios, lá diz o ditado, e além de os compadrios e influências da banca nas negociatas que os políticos tanto gostavam de fazer serem hoje mais difíceis de se concretizarem, há outro lado que lucrou com isto tudo. Falo da Justiça, que consegue trabalhar de forma mais independente, sem ordens das tutelas governamentais e cumprindo, de forma transparente, o seu papel. No fundo, o que Pedro Passos Coelho fez, não sabemos se por estar refém dos cofres vazios ou se por outras razões, foi ter-se portado como um liberal, deixando os mercados funcionarem livremente. Pode ser que o caso BES, ainda com muitas pontas soltas por descobrir, venha a revelar lições sérias, de um país que não pode confiar cegamente na selvática banca que até agora punha e dispunha de tudo. Ouvir. 

*Crónica de 28 de Julho na Antena Livre, 89.7, Abrantes. 

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