Penhorar, penhorar, penhorar!




Há duas semanas a Revista Visão publicava uma reportagem que mostrava, ponto por ponto, o cenário das penhoras em Portugal. Infelizmente, a penhora de bens é cada vez mais uma realidade para muitos portugueses. Sem capacidade financeira para gerir os créditos e as despesas gerais para sobrevivência, são muitos os casos que chegam à miséria mais nua e crua que se pode imaginar. Longe dos sentidos e da vista de muitos portugueses, estão sentimentos de perda, uma vida inteira de trabalho que é levada pela captura a sangue frio de casas, mobílias, emoções, enfim, famílias inteiras que se desmoronam quando falta aquilo que não é o mais importante mas que é essencial à dignidade. Falo do dinheiro, pois claro. Além das empresas, há milhares de pessoas que, a pouco e pouco, vão caindo na insolvência. Em Portugal, a crise económica e a Troika ajudaram, em muito, a atirar para a pobreza muitos que até então, mal ou bem, conseguiam respirar. Mas hoje, despejam-se pessoas como se fossem coisas, restos de nada que devem às Finanças, à Segurança Social ou aos bancos. Portugal tornou-se, nesta matéria, um país desumano. Não há misericórdia ante nada nem ninguém. O objectivo é apenas e somente um: cobrar até ao tutano, não deixar um só bem por penhorar. Consigo compreender que se avance para penhoras quando não houve responsabilidade, quando a má gestão familiar foi sempre maior do que a necessidade de manter as contas equilibradas. Mas, mais grave que isso, é a ferocidade com que o Estado penhora, impulsionado por essa ordem frenética de arrecadação de receita fiscal. Ao contrário do que seria justo, primeiro dispara-se e só depois se pergunta. Também esta realidade aumentou, em muito, os níveis de pobreza em Portugal. Em Janeiro deste ano ficamos a saber que as dificuldades financeiras aumentaram o risco de pobreza, por exemplo, das crianças. A desigualdade de rendimentos agrava-se. As dívidas aumentam. E quem é pobre fica cada vez mais longe de deixar de o ser. Portugal tem hoje cerca de dois milhões de pobres. Este é um duro caminho que, mais cedo ou mais tarde, quando terminar a cegueira da dívida soberana, do défice e das imposições da Troika, virá ao de cima. E aí, estaremos todos para ver, com que meios e ferramentas se combate a exclusão, a pobreza e se ajuda os insolventes. Isto, claro está, se ainda houver país.



*Crónica de 6 de Abril, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.


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