O regresso do animal. Que nunca morre.



Depois da tempestade que se seguiu à entrevista de José Sócrates, esta semana, à TVI, eis que, à distância, é possível analisar o que aconteceu. Das acusações ao Ministério Público, magistratura e Justiça portuguesa em geral, bem como a defesa, legítima, do arguido, imperou um silêncio sepulcral por parte das hierarquias acusadas. O caso do ex-primeiro-ministro não é – nem pode ser – tratado como outro qualquer. Porque se trata precisamente de um antigo chefe de Governo, ao qual, mesmo que José Sócrates não queira, estará sempre sujeito a elevado escrutínio mediático. Falemos dos factos. Conhecemos as alegadas práticas criminosas imputadas pelo MP a Sócrates. É pública a intencionalidade do juiz de instrução. Sabemos o que escreveu a Relação. Conhecemos os litros de tinta que jorraram na imprensa. E conhecemos também a lei e os prazos que as regras penais impõem. São claras duas coisas. Sem acusação é difícil tecer um juízo sobre a defesa de José Sócrates. E, na verdade, ver um cidadão ser preso preventivamente, e passado todo este tempo, estarmos num limbo como aquele que é público, é agoniante demais. Seja como for, ao contrário dos ódios que por este país se criam – política e ideologicamente falando e até nas redações – na verdade, aos olhos do cidadão comum, deverá prevalecer, acima de tudo, o princípio da presunção de inocência. Podemos ter instintos, achar que Sócrates é culpado ou inocente, mas isso, como sabemos, baseia-se apenas e só nas convicções que temos sobre o visado. Pode questionar-se se este era o tempo de Sócrates falar e defender-se (eu acho que não era, sobretudo porque devia aguardar serenamente a conclusão da investigação e a dedução ou não da acusação]. Mas Sócrates quis fazê-lo. E fê-lo com um outro propósito: voltar a ser protagonista da agenda política de que ele tanto gosta e, como reconheceu, da qual tem saudades. Ao fazê-lo, finalmente esclareceu os portugueses sobre o papel do PS e do secretário-geral, António Costa, na forma como estes lidaram com o processo. Costa sai chamuscado e fica claro que se distanciou ainda mais do que aquilo que demonstrou publicamente. Como se não bastasse, as farpas do ex-primeiro-ministro sobre as presidenciais e a ausência de uma posição do PS sobre o tema não beneficiam, em nada, o partido. Na verdade, concordamos com José Sócrates. É impensável que o Partido Socialista não tome posição sobre qualquer candidato, arriscando-se, caso não haja segunda volta, a ficar órfão de um vazio histórico imperdoável e que não honra o passado do partido. A seu tempo, dizemos nós, tudo o que foi dito por Sócrates esta semana aos portugueses terá reação e consequência. O animal está vivo. Nunca duvidamos disso. Os agentes da Justiça e António Costa sabem-no. E deverá ser esse o maior pesadelo das suas noites recentes.

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