Carta de amor ao João da Ega
Esta é uma carta de amor. Ou uma crónica, para ser mais
correta.
Uma carta de amor ao João da Ega, essa personagem brilhante
de "Os Maias", de Eça de Queirós.
Já todos sabemos que os ilustres responsáveis do ministério
da Educação decidiram retirar a obra dos programas nacionais de ensino.
Não os condenes, Ega, porque eles, muitas vezes, não sabem o
que fazem. E provavelmente nem pensam no impacto das suas decisões.
Querido Ega, escrevo-te porque tornaste-te um membro da
família. Desde o primeiro dia em que te conheci. Devia ter uns 14 anos. Foi
contigo que aprendi o melhor do escárnio e maldizer, da boémia e dos prazeres
mundanos, da sagacidade e da prova mais fiel do significado da amizade.
Que serão destes meninos e meninas agora que deixarão de te
conhecer e de saber que houve um Carlos da Maia e uma Maria Eduarda?
Tristes dos que agora criam gerações futuras sem lhes darem
o sabor do teu fel. Pois meu querido João da Ega tens aqui um pretexto para
renascer no século XXI.
Há escritores maravilhosos neste canto lusitano mas ninguém
como Eça poderá um dia nascer.
Tu, meu querido João, não tens como escapar. Arranja o
bigode, endireita a espinha e desce firme rua abaixo. Portugal já não é nem
sequer um bairro sem ti. É apenas uma imagem de estacas em pé. E expurgamos da
vida o melhor que ela tem.
Voa Ega, voa, eu prometo apanhar-te na próxima esquina da
vida.
*Crónica de 23 de julho, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.
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