Carlos Cruz é também...o ser humano
Foi um homem sofrido que se mostrou ontem aos portugueses. Carlos Cruz, entrevistado por Daniel Oliveira, no programa «Alta Definição», na SIC, falou dos últimos sete anos da sua vida, do pesadelo em que ela se transformou com o processo «Casa Pia», do tempo em que esteve na cadeia, das rotinas, da destruição material e psicológica que se abateu sobre ele. Culpado ou inocente, tentei despir-se da pele de mulher que olha para o «sr. Televisão» como suspeito de ter cometido abusos sexuais sobre crianças. Caiu-me uma lágrima no rosto. Se for considerado inocente, é duro imaginar como se reconstrói uma vida de décadas, aos 60. A Justiça portuguesa terá a missão de fazer o seu trabalho. Culpado ou inocente, pela primeira vez, olhei para Carlos Cruz apenas como o ser humano e coloquei-me na pele do eventual inocente. Foi um bom exercício num País onde o ónus da prova está invertido para a sociedade: arguido não é inocente, é visto como culpado. E em vez disso é culpabilizado e mortificado muito antes do veredicto. Há dias que vale a pena acordar e fazer o que fiz ontem: ver os dois lados do problema e senti-los. Torna-nos pessoas mais abertas à compreensão. E reconheço: faz de nós melhores seres humanos. Porque, a verdade, nua e crua, é que é sempre mais fácil condenar e criticar antes de saber a verdade toda.
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Mas também é verdade que o ónus da prova está invertido porque a Justiça está, ela própria, invertida e quando se olha para o lado e se vê que a Justiça não funciona é compreensível duvidar das suas decisões e indecisões. Infelizmente são demasiados casos para que se trate de um problema conjuntural.
Depois, há a questão da justiça pública ser feita pelos jornais, que emulam os tribunais num regresso ao apedrejamento na praça pública. Será bom ou mau, afinal?
Confesso que me conforta mais a existência de uma fuga de informação para os jornais do que a ignorância da inoperância e do clientelismo da Justiça. Naturalmente os cordeiros sacrificiais discordarão, inocentes, quando os há.
A única solução possível encontra-se em tornar a Justiça célere e eficaz. Tudo o resto são efeitos colaterais que se extinguirão com o tempo.