«A ortografia não vai a votos»
«Os que o defendem, dão-no por adquirido; os outros, os que ainda lhe resistem, talvez o vejam como facto consumado. A verdade, sintomática, é que nenhum (NENHUM!) dos partidos a ele recorreu para a escrita dos seus programas eleitorais. Até o PS, seu ardoroso paladino, apesar de no ponto 10 do programa eleitoral dizer que é preciso promover a identidade cultural “consolidando a aplicação do Acordo Ortográfico em Portugal e nos países da CPLP” (é o único partido que fala explicitamente no AO, aliás) escreve, por exemplo, “vectores” e não “vetores”, “actividades e não “atividades”. O BE cala-se sobre o tema e o PCP diz que é preciso “promover a expansão e qualificação do ensino da Língua e Cultura Portuguesas”, mas escrevem ambos “objectivo” e não “objetivos”; “actual” e não “atual”, “sectores” e não “setores”, “trajectória” e não “trajetória”, “optimista” e não “otimista”. O CDS, que fala da língua portuguesa em mais do que um ponto do seu programa, ora como argumento para manter um canal público de televisão ora para dizer que, junto com o património imaterial, ela é um factor de “afirmação de Portugal”, escreve “directo e não “direto”, “tecto” e não “teto”, “electrónica” e não “eletrónica”. E o PSD, que no seu extenso programa fala em “promover novas formas de apoiar o ensino português como língua materna”, escreve “directiva” e não “diretiva”, “acção” e não “ação”, “selecção” e não “seleção”. Ou seja, a nenhum deles se mostrou imperioso ou sequer útil, mesmo que por estritas razões ideológicas, o recurso à “novilíngua” patrocinada por Malaca & Bechara. E se a ortografia, na variante falsamente “moderna” que por aí circula como válida, não vai a votos, melhor seria que a metessem noutra urna. E a lançassem… talvez ao mar».
Nuno Pacheco. Público.
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