Maçonaria - a refundação urgente.

Declaração de interesses: sou jornalista e, sim, já fui aliciada para ingressar a fileira da Maçonaria.
Talvez a ironia possa estar implícita neste início de crónica, e eu não devesse assumir que já fui sondada para integrar uma das grandes lojas do país, mas faço-o por considerar que, pese embora o facto de estar numa profissão que muitos consideram de poder ou a ele associado, a verdade, é que as resistências morais e éticas têm protegido, felizmente, a classe jornalística.
E ainda que o aliciamento à causa do avental seja frequente, um jornalista sabe que antes de ser cidadão é isso mesmo, jornalista.
Se por um lado, sempre me indignaram os preconceitos existentes na sociedade portuguesa contra a Maçonaria, por outro lado, as ligações criadas nas grandes lojas, deitam essa minha perplexidade por terra. E nem mesmo com a implantação da Democracia em Portugal, a condição de maçom deixou de estar associada às perseguições do indivíduo, a incompreensões e até a muitas injustiças morais. Os valores maçónicos modernos não são contestáveis, se nos relembrarmos que têm a sua força nos ideais do Iluminismo do século XVIII, assente na igualdade, liberdade, tolerância e fraternidade. Todavia, os requisitos da inscrição maçónica trazem consigo regras perigosas, sobretudo, na promiscuidade das relações que se criam entre ‘irmãos’. E se pensarmos que alguns deles estão em áreas sensíveis como a política, a economia e/ou a Justiça, mais polémica se torna a discussão do tema. O problema, sabemos todos, são algumas das motivações que levam ao ingresso nestas sociedades semi-secretas e as suspeitas que surgem quando alguns desses homens e mulheres ascendem a determinados cargos de poder de forma tão rápida quanto estranha.
Em vez de se promover o homem justo, o livre pensador, com valores de ascensão meritória, acaba por criar homens com aspirações ardilosas, e que tudo fazem para subir na vida movendo as mais perigosas influências. Os aventais, alguns nunca usados, escondem ligações ao poder. Vemos isso no Parlamento, nas autarquias e até em juntas de freguesia. Olhamos para as maiores empresas nacionais e eles lá estão, no patamar maior do poder.
O PSD foi a última ‘vítima’ apanhada na malha. E de imediato, a esquerda mais radical veio tentar lavar as mãos, com Jerónimo de Sousa a garantir que no PCP não há maçons, num verdadeiro tiro no pé e areia que não cega os nossos olhos. Como bem confirmou António Arnaut, ex-grão mestre do Grande Oriente Lusitano (GOL), os maçons ligados à política não são exclusivos dos principais partidos do arco do poder. Eles proliferam em todas as forças partidárias. E de que maneira… As críticas à Maçonaria têm sido frequentes e persistentes. E às vezes cansam. Mas eu, estou do lado daqueles que se assumem como maçons, sem medos nem temores. Os homens bons, que nada temem, que nunca conheceram a teia das conspirações, das influências e do poder, devem pois assumir-se e orgulharem-se dos valores maçónicos.  Os outros, que recusam falar sobre essa mesma condição, que se escondem e que têm vergonha de o assumir, são precisamente os que temem o escrutínio público da sua actividade. Não somos parvos. Sabemos quem são. Porque sabemos os seus nomes, que funções públicas exercem, em que processos judiciais estão envolvidos e a sua verdadeira essência (i)moral. Coisa diferente é a obrigação, como muitos também defendem, de se obrigar à declaração formal de condição de maçom. Qualquer cidadão deste país, quando ingressa num posto de trabalho, não lhe é pedido que esclareça se se é Católico ou ateu, se somos do Benfica ou se somos homens ou mulheres de esquerda ou de direita. Mas há lugares que exigem essa assunção, sobretudo quando os mesmos se encontram em limbos de poder. A Democracia, sabemo-lo, é também ela potenciadora de corrupção, porque a liberdade total não existe, mas é vilipendiada quando os direitos e deveres democráticos são expelidos da nossa condição moral. Por mim, gostava de ter homens maçons do meu tempo, como Montesquieu, Voltaire, o Marquês de Pombal, Diderot, Camilo Castelo Branco, Alexandre Herculano, Bernardino Machado ou Eça de Queirós. Gostava… Baralhando e voltando a dar, tal como os Estados, os países, as sociedades e a Igreja, também a Maçonaria precisa de ser refundada. E isso só está ao nível dos homens bons, não corruptíveis. E quero continuar a acreditar que ainda existem.

Nota: Artigo publicado também na revista O Instalador.

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