Os limites da dignidade.
Um
mês depois da tragédia do Meco que vitimou seis jovens universitários da
Universidade Lusófona, fico perplexa com o conjunto de notícias que têm sido
divulgadas nos últimos dias na comunicação social a propósito das praxes
académicas. Não é novidade para ninguém que as tradições académicas nalgumas
universidades portuguesas, extravasam o aceitável e moralmente aceite. Também
incompreensível para mim são, há muitos anos, os rituais e acções praticadas
por estes jovens que recebem futuros colegas no palco do saber. Falo com
conhecimento de causa. Também eu já fui aluna universitária. Mas, ao contrário
de muitos jovens, sempre recusei submeter-me a actos desumanos, sempre disse ‘não’
a desrespeito verbal e físico, e, talvez por isso, não tenha sido praxada,
talvez por isso me tenha excluído de todas as acções académicas que violentavam
a minha pessoa e a minha dignidade.
O
caso do Meco veio perturbar ainda mais as consciências porque de facto acabou
na tragédia que todos conhecemos. Ainda que não saibamos o que aconteceu realmente. Ainda assim, há anos que estas infantilidades
e práticas, que normalmente acabam sempre em abusos, são do conhecimento
público e estão nas mãos das Universidades. Famílias, alunos e sociedade
sabem-no mas sempre ignoraram a sua existência. Se persistem é porque a mão
firme das direcções das Universidades Portuguesas não tem sido assim tão dura.
É possível manter a tradição académica de forma saudável e com o fim adequado
sem sujeitar o ser humano a situações deploráveis de indecência. A dignidade
tem limites e compete a cada indivíduo mantê-la intacta. Por isso, estes jovens
que serão o futuro país de amanhã, devem pensar naquilo a que realmente querem
sujeitar-se. O poder e respeito académico sê-lo-á amanhã, em qualquer hospital,
em qualquer tribunal, em qualquer local onde exerçam a sua profissão. E a
dignidade meus caros jovens é algo que devem manter intocável durante toda a
vossa vida. Talvez o exemplo do Meco sirva, definitivamente, para mudar
qualquer coisa neste tipo de rituais e despertar consciências silenciosas. Que
a tragédia nos faça pensar a todos se é isto que queremos ser amanhã, nesse
futuro de qualidade que todos defendemos.
*Crónica semanal de 27 de Janeiro, na Antena Livre, 89.7, Abrantes.
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