Polícias, razões e erros.
Na semana passada assistimos
todos em directo aquela que foi considerada pelos sindicatos como a maior
manifestação de forças de segurança realizada em Portugal. Quinze mil pessoas. Da manifestação muito há por
dizer ainda que eu me cinja apenas ao mais importante. E, para mim, que conheço
melhor que ninguém o interior da PSP, no caso, os gritos de revolta que em
Lisboa se ouviram são mais que justos. São até uma violência da alma. Desde que a Troika por cá
entrou que as forças de segurança têm sido terrivelmente atacadas, na folha
salarial, obviamente, mas na sua dignidade de classe e profissional. Não se
pode tratar agentes de autoridade como simples funcionários públicos. Por várias
razões, mas acima de tudo porque não trabalham das nove às cinco, porque é uma
profissional que comporta riscos de vida elevados, um lugar onde ninguém quer
estar e tantas vezes mal entendido. Há famílias inteiras que
dependem de um miserável ordenado de 700 euros. Isto para homens e mulheres que
arriscam a vida por todos nós, que dão o corpo às balas e não se queixam da
escolha que fizeram. Simplesmente pedem dignidade. Dignidade numa mera folha
salarial que alimente bocas lá em casa. Por isso estou com todos
eles. Ao seu lado. Como cidadã, mas essencialmente como alguém muito próximo da
dureza das suas vidas. Desta manifestação, de homens
e mulheres que nunca viram o direito à greve reconhecido constitucionalmente,
há apenas uma macha a registar e com a qual me indigno. A tentativa de invadir
as escadarias do Parlamento foi um erro. Um erro de principiantes, movido pela
ira da comunicação social que lançou, em parte, algumas flechas para que tal
acontecesse. Mas essencialmente foi um
erro de pouca inteligência, não só porque é ilegal – e estas pessoas sabem-no
melhor que ninguém – mas acima de tudo porque carimba o descrédito das
motivações de revolta que ali levaram estes milhares de agentes. A austeridade e a dívida
pública não pode valer tudo. E não pode cortar nas pessoas como se fosse
coisas, meros objectos sem valor. Esse é o maior crime que se está a cometer
nos países com programas de ajuda externa internacional. Um dia os dirigentes
nacionais e internacionais vão perceber isso. Mas esse dia chegará tarde, muito
tarde, porque pode já não haver pessoas.
Crónica de 10 de Março, Antena Livre, 89.7, Abrantes.
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