A portugalidade pode (sempre) esperar.
Com o calor,
chegam as festas de Verão, que já arrancaram um pouco de norte a sul do país.
Com Junho chegou também um mês inteiro de campeonato do Mundo de Futebol, e com
tudo isto, é quase certo que os portugueses vão andar bem distraídos por estas
semanas. Ao mesmo
tempo, o Governo de Pedro Passos Coelho vai tomando decisões, vai falando à
comunicação social distraída, e, aqui e ali, começamos a perceber que o chumbo
recente do Tribunal constitucional a três artigos do Orçamento do Estado vai-se
agudizando, sem solução à vista. Entre
acusações nunca vistas anteriormente, trocadas entre um Governo e o Tribunal
Constitucional, a verdade é que se entrou numa escalada interminável de
galhardetes, com a dramatização dos discursos políticos e as ameaças já
habituais nas vésperas de legislativas. A juntar à
festa, a ministra das Finanças soprou a partir de Bruxelas, que o Governo «pode
ponderar a hipótese» de prescindir da última tranche dos empréstimos concedidos
no quadro do programa de assistência financeira ao país. Um cheque que está suspenso até à adopção de medidas alternativas às
chumbadas pelo Tribunal Constitucional. Pois é. De facto é triste saber que
agora, um mero chumbo deste tribunal, a par de outros do passado, já não coloca
em causa o tal esforço pedido aos portugueses. É bom saber que agora os mercados já não são importantes nem os juros se
importarão. Tristemente, o Governo mostra que já pensa em campanha eleitoral,
em eleições, e na forma como irá posicionar-se para esse escrutínio. E todos nós, que estamos a sofrer na pele as consequências de uma dura
austeridade que não merecemos, ficamos a assistir, impotentes, como sempre. Em
Belém, diz que há Presidente. Mas é melhor não contar com isso, já que nem por
sinais de fumo, Cavaco Silva emite qualquer som. Entretanto, haja Mundial de Futebol, haja festa, sardinha assada e
caracóis e venham as férias. A portugalidade pode esperar, as nossas condições
de vida também. Mas nesse dia, quando voltarmos todos a acordar, já não haverá forças
nem sequer para erguer bandeiras nem cartazes sindicais.
* Crónica de 16 de Junho, Antena Livre, 89.7, Abrantes.
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