A missão suicida e sincera de Tsipras.
Agora
que os meios de comunicação social em Portugal já não fazem da Grécia um circo
mediático e histérico, detenho-me hoje sobre o desfecho grego. Um final com
sabor a tragédia que coloca o povo grego num beco sem saída e onde respirar é
missão quase impossível. O acordo, como lhe chamam, é duro. A dívida, essa, já
o sabemos, não será paga na totalidade, como o próprio FMI já veio dizer,
sabendo, de antemão que vai ficar a ver navios no dinheiro que mandando para Atenas.
As duras condições que a zona euro impôs à Grécia para
evitar a saída da moeda única têm merecido críticas da comunidade internacional,
e já é certo que, sem reestruturação da dívida, não há resgaste possível. Christine
Lagarde, que não assume totalmente as culpas do falhanço dos planos de
austeridade impostos aos países do sul, já deu sinais de que não está disposta
a cometer agora o mesmo erro e, por isso, vai pressionando para que a zona euro
avance rapidamente para um alívio na dívida helénica. A questão gera polémica e zangas junto dos parceiros europeus, que são nesta
altura os principais credores da Grécia. Há problemas mais imediatos para
resolver. A Grécia vai precisar de sete mil milhões de euros só para fazer face
às amortizações de julho e um dos pontos do acordo que saiu da cimeira do euro
foi um empréstimo de urgência a Atenas, enquanto o terceiro resgate não chega. A
ideia absurda de pedir aos 28 Estados-membros que ajudem a resolver o problema aumenta
ainda mais as tensões de uma União Europeia em desagregação. Como é óbvio não
se pode imputar uma fatura tão elevada a quem nunca acreditou na moeda única
nem dela quis fazer parte. Uma coisa é certa, os discursos não pagam dívidas.
E, na verdade, esse foi o maior erro de um primeiro-ministro que acreditou que
as palavras podiam salvar a situação do seu povo. Ao contrário de muitos, nunca
achei que Tsipras fosse irresponsável do ponto de vista dos cidadãos. Acredito
mesmo que ele por enfrentar os credores em nome do sofrimento de um país.
Sabíamos que, com estes líderes europeus, a missão seria suicida.
Politicamente, pagou caro a corajosa missão. Perdeu o partido, perdeu muitos
eleitores e perdeu, tristemente, a esperança. E apesar de suicida na missão,
discordo daqueles que continuam a dizer que o primeiro-ministro grego
instrumentalizou o povo com discursos emocionantes e inspiradores. É certo que
esses textos floreados não pagam dívidas, mas Tsipras fica para a História como
o homem que aumentou a tragédia grega mas, ao mesmo tempo também, o único que
enfrentou a senhora Merkel e a toda poderosa Alemanha que acha que pode tudo. E
tristemente, continua a poder. Dos fracos não reza a História, é certo, mas
destes Grandes que se mostram no Velho Continente nesta primeira metade do
século XXI também não restará história digna de memórias. O povo, esse, tem
agora pela frente um caminho de espinhos, um mar de assaltos e uma assustadora falta
de fé no futuro. Que os deuses possam acalentar-lhes as vidas, pois já nada
mais lhes resta a não ser a fé.
*Crónica semanal
de 20 de julho na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.
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