A marca Belmiro que os canalhas não matarão


No momento em que escrevo, meio país já disse e escreveu o que pensa sobre Belmiro de Azevedo. Controverso para muitos, visionário para outros. Eu acho que foi ambos.

Estive com ele duas vezes, na condição de jornalista. Em 14 anos de profissão não encontro momento nenhum em que lhe tivesse faltado a educação e a delicadeza no trato.

Mas há outros lados, tantas e tantas vezes, confundidos com insensibilidade. O facto de ter às costas um império empresarial construído com o seu suor, deu-lhe margem para ser direto, frontal, firme nas escolhas e sem papas na língua. Compreendo-o, apesar de muitas vezes ter discordado dele. O suor confere-nos direitos universais de individualidade, de retidão, de propriedade.

Somos suor? Então não há poder que nos detenha. Não há medos nem laivos de carneirada. Foi isso que o pai da Sonae sempre fez. Sem temores. Por causa disso também (e não só), ganhou ódios, que nunca o venceram, como assim tem de ser com os homens escorreitos.

A sua riqueza, gerada do tal suor, nascida de si mesmo, dos seus sacrifícios, potenciou sempre invejas na sociedade, que se pretende civil.

O país, que devia ter olhado para ele como exemplo, fez muitas vezes o oposto: viu-o sempre como um capitalista malfeitor, que explorava os mais pobres, que lhes dava migalhas. Essas migalhas foram e são hoje ainda aproveitadas por milhares nas dezenas de empresas que criou. Pessoas que não tiveram outra alternativa melhor, que lhes faltou a oportunidade merecida e que, pese embora algumas ganhem - injustamente - mal, agradecem, sem vergonha, o trabalho que encontraram na Sonae.

E é fácil perceber porquê. Nunca lhes faltou um salário, um subsídio ou outros direitos consagrados na Constituição. Mas mais importante que isso reconhecem a cultura da marca Belmiro.

A marca que valoriza os seus quadros, que não os menoriza, que rejeita a incompetência e a insolência, que fomenta a disciplina e o rigor, em suma, que lhes incute o valor da MERITOCRACIA.

Pontos-chave que distinguem os empresários visionários dos outros.
Discordei dele mais do que convergi. Mas tenho de honrar o pensamento livre que me concede a liberdade.

Belmiro de Azevedo não foi apenas o homem mais rico de Portugal - frase tão pequenina quanto a dimensão mesquinha que ela encerra. Belmiro foi o empresário que provocou uma revolução social neste país, no país pobre e sofredor que ultrapassou abril.
Por tudo isto, e tanto mais, o país deve-lhe muito.

Os canalhas que hoje discordaram do voto de pesar no Parlamento são apenas e só isso mesmo: canalhas. De caráter. Unicamente. Mas legítimos. Legítimos na liberdade. Tal como eu, que provavelmente serei para muitos, uma canalha, em cada linha deste mísero texto a realçar o legado de um empresário - essas osgas tenebrosas, pensam eles.

A ideologia não deixa de a ser quando estamos do lado certo da justiça. Da mesma justiça que merecem os homens que marcam uma Nação.

Belmiro, que morreu hoje aos 79 anos, será sempre, contra a vontade dos canalhas, um homem que construiu este país. Porque ninguém é proprietário de conquistas. Somos todos, sem exceção, contribuidores de abril ou do que lhe quiserem chamar.
Boa viagem, eng.!

Nota: comecei a minha carreira, há 14 anos, no Público. Naqueles 22 anos, acabada de sair da Faculdade, os sonhos eram uma realidade para uma jovem ainda não conspurcada pelas desilusões, da vida e da classe, que haviam de chegar com o tempo. Na rua Viriato, onde o jornal estava na altura, tive a sorte de entrar numa casa de liberdade, sem interferências de quaisquer poderes, incluindo o do patrão. O do patrão Belmiro. Também este foi e é um legado único do homem que respeitou sempre a liberdade de criar, a liberdade do jornalismo, a liberdade de ser.

Comentários

Mensagens populares