Pedrógão: um Estado que falhou, uma vergonha de cada um de nós

Foto: Paulo Leitão 

Na semana passada abordei aqui a forma como as populações de Monchique, no Algarve, estão a ser esquecidas nos apoios à reconstrução das suas casas e atividade agrícola, após os incêndios deste ano.

As incongruências e o tardio apoio, fruto de complexos e complicados processos de candidaturas, é um facto à vista de todos os portugueses.

Mal sabia eu o que a investigação da jornalista Ana Leal, na TVI, tinha ainda para revelar.

Há muito que as suspeitas de favorecimento e distribuição injusta de apoios em Pedrógão Grande andava no ar. Há, inclusivamente em marcha uma investigação criminal para apurar o que se passou.

Mas agora surgem mais 30 novos suspeitos de casas que arderam na tragédia do ano passado e que foram reconstruídas ilegalmente.

Em causa estão habitações devolutas antes do incêndio, segundas habitações transformadas em residências permanentes, casas construídas de raiz onde antes existiam ruínas.

Tudo com a conivência de membros da autarquia que alegadamente recusaram apoios a quem precisava e os ofereceram a quem bem entenderam sem prestarem contas a ninguém.

Tudo isto provoca na sociedade portuguesa um enorme desconforto e injustiça tendo em conta a dimensão da tragédia.

Dos dez arguidos até agora constituídos as suas relações familiares e próximas com membros da autarquia e de juntas de freguesia estão à vista de todos.

Depois de tanta dor, e de uma tragédia sem precedentes, como pôde o Estado português deixar que o compadrio andasse à solta em Pedrógão Grande, sobretudo com o dinheiro dos portugueses e com os fundos públicos do país e da União Europeia?

Que responsáveis políticos de topo temos nós, afinal, em Portugal que deixaram os que mais precisam, os que perderam tudo, a começar por familiares, à mercê de caciques e de gente sem escrúpulos?

Pedrógão Grande transformou-se tristemente num caso de polícia. E se a Justiça falhar, somos também todos nós que falharemos e faltaremos aos nossos.

Espero que o primeiro-ministro e o Presidente da República se sintam tão envergonhados como eu. E que hajam em conformidade com o que andaram a apregoar no terreno semanas e meses a fio. São também eles a cara desta vergonha inacreditável.

*Crónica de 17 de dezembro de 2018, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. 

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