Uma viagem de comboio com...dois funcionários públicos
Na senda do início de funções do atual – e maior – Governo da
história da democracia portuguesa, esta manhã, em pleno comboio suburbano de
Lisboa, assisti a uma conversa que reflete, em muito, o espírito daquele
funcionalismo público que incomoda muitos cidadãos portugueses.
Falo de um funcionalismo público, carregado de vícios,
agarrado a zonas de conforto, onde a paragem no tempo é a máxima que se impõem
a si mesmos há muitos anos.
Dois colegas, em gabinetes ministeriais, comentavam as
entradas e saídas das secretarias, falavam do frenesim dos últimos dias,
troçavam daqueles que saíram com as eleições, criticavam colegas que ficaram e
que, por via das mudanças, ascenderam na carreira.
Os dois funcionários públicos – um homem e uma mulher, ambos na
casa dos 50 anos – falavam como se os seus lugares nunca estivessem ameaçados,
comentavam como se fossem melhores que todos os outros, agarrados a uma velha
máxima de maledicência sem igual.
Durante 15 minutos, o tempo que durou a minha
viagem, não ouvi um único rasgo de bondade, de ousadia, de positividade.
Falaram dos ministros que agora vão ocupar as tutelas onde
trabalham, numa caracterização cinzenta sobre as pessoas, uma delas, que agora
sobe a ministro, nem sequer conhecem.
Os dois funcionários públicos – um homem e uma mulher, ambos na casa dos 50 anos – falavam como se os seus lugares nunca estivessem ameaçados, comentavam como se fossem melhores que todos os outros, agarrados a uma velha máxima de maledicência sem igual
À minha saída ainda ouvi a mulher, de trato difícil, sempre
zangada com a vida, soltar: «faltam-me cinco anos, até lá é aguentar e passar
despercebida o mais possível». Ao ouvir isto, eu, que já estava de costas,
virei-me para trás, para ver melhor o seu rosto. Foi nesse momento que as
portas do comboio se abriram e eu entrei na dimensão em que me encontro: do
lado do privado da barricada.
Nem todos os funcionários públicos são maus ou aquilo que,
muitas vezes, achamos que são. Como em todas as empresas, em todas as famílias,
em todas as instituições, há bons e maus profissionais, boas e más pessoas,
péssimas e excelentes formações profissionais.
Contudo, é esta forma de estar e ser, que passa para os
cidadãos, que sempre me incomodou. E está enraizado. Uma negra raiz que só pode
ser terminada com novas gerações, novos modos de trabalhar, novas experiências
e, sobretudo, uma enorme vontade de mudança. A começar pela rececionista do
ministério ao líder da casa.
Felizmente, é uma geração profissional que começa a quebrar,
empurrada pelas novas que irão, seguramente, fazer diferente. Não sei se
melhor, mas diferente. É isso que eu espero. E tenho fé. Até porque conheço
muitos dos bons que estão agora nas linhas dirigentes da Função Pública e que
estão a fazer essa diferença. Assim aconteça cada vez mais e seja transversal.
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