Presidenciais 2021: Marcelo garante estabilidade, com a extrema direita a impor-se

Sem surpresas, Marcelo Rebelo de Sousa foi reeleito presidente da República. Num tempo inédito, numas eleições difíceis, numa altura em que o país precisa de governantes à altura, o país escolheu, como se esperava, a estabilidade política. Contudo, independentemente do candidato que ficar em segundo lugar é bom que os democratas deste país olhem para o que André Ventura acaba de conseguir neste ato eleitoral. Qualquer coisa como 2 dígitos. Preocupante? Sim. Mas com causas muito bem identificadas, a começar pela falta de comparência dos partidos do sistema. Falta de comparência essa que ocorre há muito tempo. Falaremos disso na crónica destas eleições em breve. Amanhã há pandemia para continuar a gerir. E é bom que Marcelo ganhe coragem e exerça, de uma vez por todas, com firmeza, a sua magistratura de influência, e garanta uma gestão mais responsável desta crise sanitária. No dia em que o país foi a votos, registamos, ironicamente, o maior número de mortos (275) até hoje. Simbólico? Não. Real.

Ana Gomes: a honra do segundo lugar (democrático)

Ana Gomes foi, para mim, uma das vencedoras desta noite. Conseguiu um honroso (e esperado) segundo lugar, sem o apoio do PS, que, nestas eleições, tristemente, não a apoiou. Numa eleição duríssima, numa campanha ainda mais tenebrosa, e em esforço, mobilizou como pôde, combatendo mais a extrema direita do que vincando a sua espinha. Contudo, há momentos em que é preciso. E este foi. Mas foi também graças a muitos socialistas, que não se vergaram à candidatura de Marcelo, nem à doçura de Costa, votaram em Ana Gomes. A sua candidatura representou valores essenciais para a democracia. Pese embora as suas fragilidades, que sabíamos, jamais venceriam o populismo, o que a fragilizou, e muito, foi a falta de comparência do seu partido. Pode dormir descansada, porque cumpriu a missão no espaço ideológico que representa.

O falhanço da esquerda

Marisa Matias teve, nestas eleições, um resultado longe do que esperava (4,0%). Basta ver as diferenças para o resultado (10,12%) que obteve em 2016, ficando à frente de Maria de Belém. Combater a extrema direita falhou. O movimento #vermelhoembelem não chegou. Mas também falhou a estratégia de resgatar a esperança do seu eleitorado. Um eleitorado que está a sofrer, e muito, as consequências da crise atual. Não é só o centro direita que tem de repensar o que está a falhar. A esquerda mais extremada também tem de o perceber. O eleitorado do BE e do PCP (havemos de falar dele) está a dar mensagens muito claras aos seus dirigentes e aos seus discursos já gastos. É uma questão de os ouvir bem.

Já João Ferreira, apontado por muitos, como o sucessor de Jerónimo de Sousa à frente do PCP, também não descolou nesta campanha, apesar de, a par de Tiago Mayan Gonçalves, ter sido um dos candidatos com uma campanha mais sóbria e séria no discurso.

Em 2021, Bloco e PCP tiveram a confirmação da desgraça que já se tornou hábito em presidenciais. A isso junte-se o facto de, por não terem obtido 5% dos votos (como consta da Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais), não terem direito à subvenção estatal. O grave é que Marisa Matias (256 mil euros) e João Ferreira (450 mil) foram os candidatos com orçamentos mais elevados.

Meio milhão de portugueses com Ventura

Falar de André Ventura é falar de perigo imenso para a democracia. Mas ignorar o resultado que o líder do Chega obteve este domingo é ignorar o óbvio e, uma vez mais, um tiro no alvo errado. Como voltou a fazer esta noite a esquerda. Continuar nesta cegueira - como fazem o BE e o PCP - é fomentar o crescimento da extrema direita em Portugal. É insistir num erro tenebroso. É bom que reflitam todos sobre o que hoje aconteceu. Meio milhão de votos. Meio milhão. É só isto que tenho a dizer sobre André Ventura. Porque ele, não duvido, continuará a fazer o seu papel. Quem duvidar disto, não percebeu nada do que aconteceu hoje nas urnas. O combate é urgente e necessário. Mas tal como disse Marcelo na campanha, não se combate proibindo, combate-se com as ideias.

A surpresa Mayan e o fim do CDS

O candidato apoiado pela Iniciativa Liberal surpreende nestas eleições, com uns 3,2%. Na verdade, Tiago Mayan Gonçaves trouxe a estas eleições um alento ao eleitorado do centro direita, liberal, que não se identifica com Ventura e que se cansou do PSD e do CDS que praticamente deixa de existir. É certo que os centristas apoiaram Marcelo nesta eleição, contudo, não deixa de ser preocupante o espaço ideológico que o CDS começa a perder para o Iniciativa Liberal e para o Chega. Destas eleições, seria bom que o partido do Caldas começasse a perceber a hecatombe que pode estar à espreita no futuro próximo. E isso não é bom para a democracia. De todo.

Abstenção

Uma vez mais, continuamos a não conseguir combatê-la. Ela continuará, não duvido, a ser a principal adversária dos políticos e partidos deste país. Enquanto não houver uma refundação profunda do sistema e dos seus representantes, continuamos a tê-la como sombra. 60,5% nestas presidenciais 2021.

Por fim, uma nota para dizer que Portugal foi a votos num momento muito difícil da pandemia. Sempre fui contra a realização das eleições nesta conjuntura. Continuo a achar que não podemos ser um país contraditório, que faz uma pausa para ir votar, como se em 24 horas não houve pandemia. Apesar disso, dizer que a organização que pude assistir país fora, está de parabéns, julgo que se garantiu o mínimo de condições de segurança. Contudo, é uma injustiça tremenda para muitos portugueses que se viram impedidos de votar, fruto de terem sido infetados por Covid-19 na semana que antecedeu as eleições e tantos outros que, devido a esta situação, não o puderam fazer.

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