Carta de amor aos idosos do Interior de Portugal


É uma imagem recorrente. Ano após ano. Em todas as tragédias. Mas, neste caso, falo particularmente dos fogos. E falo dos idosos. Esse grupo frágil, que, no Interior do País, vive à mercê de uma sorte inglória. Ou sem ninguém, ou sem os filhos e netos distantes, e isolados. Do mundo. De vida. De outras descobertas. Com condições económicas, na sua maioria, muito débeis. Quando, no Verão, o fogo lhes bate à porta, perdem muita coisa, muitas vezes, muito até. As culturas, os animais (que tanta companhia lhes fazem) que são muitas vezes ferramenta de trabalho, a casa até. Vem este post sobre os idosos porque ontem, mais uma vez, vi um deles, desesperado, em Silves, em mais um famigerado incêndio dos tempos estivais.

E tenho sempre a mesma reação: apetece-me ir lá, dar-lhe um abraço e ajudar como puder. Depois, bate-me aquele momento negro, em que o choro, o rosto moldado pela dor, me revolta. O momento dos incêndios é duro para os nossos idosos que vivem no Interior, e tão esquecidos são. Mas o pior vem igualmente depois. Quando todos se vão, e têm de enfrentar a paisagem negra, nem uma cor alegre, ninguém para lhes acalmar o espírito.

Esta é uma carta aos idosos do Interior. Abandonados por todos nós o ano inteiro. Consciente disso, sei que também tenho culpa. Devia ir mais vezes à minha aldeia. Devia fazer mais por eles. Também por isto não me perdoo, sempre que vejo estas imagens anualmente. Aqui, me confesso culpada pela minha ausência. Ainda assim, quero dizer-lhes que, pudesse eu, e dar-lhes-ia o conforto e a paz que tanto merecem. Abraço-os a todos como se fosse sua neta. E tenho-os em pensamento em cada momento da sua dor.

A foto é icónica. E trágica. Incêndios de 2017 em Portugal. Nuno André Ferreira/Lusa 

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