A massa de João Proença.
João Proença, líder da UGT, representa, na perfeição, o
português dos tempos modernos. Critica pela boca e desfaz pela acção. Sabe de
tudo sem conhecer muitas vezes as matérias de que fala. Alto defensor da ética,
dos direitos adquiridos da classe operária, digno representante do anti-poder
do momento. Juntamos a isto um João Proença crítico acérrimo do Estado social
que definha e que agora, diz o Primeiro-Ministro, está a ser refundado. Mas o
líder da UGT demonstrou nos últimos dias de que é feita a sua massa. O homem
que não quis juntar a sua central sindical à CGTP na greve de 14 de Novembro próximo,
é o mesmo que vai fazer greve no mesmo dia, já que, diz ele, a FESAP, sindicato
de que faz parte, vai aderir à paralização. Não dou lições de moral a ninguém,
já que não tenho legitimidade para tal. Mas quando os indivíduos aceitam
liderar instituições públicas, têm de saber decidir em coerência com a
filosofia dessa mesma liderança. A UGT devia associar-se à greve de 14 de
Novembro. Isso é claro para mim e, penso, é claro para a maioria dos cidadãos. Ora,
a greve geral de 14 de Novembro foi convocada pela CGTP em protesto contra o
agravamento das políticas de austeridade. De imediato, a UGT se demarcou da
paralisação por considerar que foi motivada por questões político-partidárias. Pois
é, quando tudo se quer, também tudo se perde. A solidariedade sindical é algo
que sempre manteve as estruturas coesas. O nosso sindicalismo, bem sabemos, que
caminhos tem seguido nos últimos anos. As influências e ingerências partidárias
estão à vista de todos e são clarinhas como a água. Por tudo isto, João Proença
está exactamente ao mesmo nível dos políticos que critica e do poder
actualmente em exercício. Promete e não cumpre. Desfaz-se em retórica barata e,
na prática, não sai da toca, protegendo a agenda política que serve há décadas.
Pegando na expressão que anda nas bocas do país e que Pedro Passos Coelho
utilizou recentemente, na verdade, também os sindicatos precisam de uma
profunda refundação. Resta saber se há gente capaz de a concretizar. Tenho as
minhas dúvidas, já que as raízes podres são as mais difíceis de expurgar.
Crónica na Rádio Antena Livre (89.7), Abrantes, de 5 de
Novembro.
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