Delapidação do SNS. Ou será mais depilação?
O caso que veio a público nos últimos dias das médicas e
enfermeiras do Hospital de S. João, no Porto, acusadas de falsificar documentos
de supostos tratamentos dermatológicos para fazer depilações à custa da ADSE, é
só um exemplo do cancro que ainda lavra no Serviço Nacional de Saúde. As mulheres estão já acusadas pelo Ministério Público de
obterem pagamentos da ADSE para tratamentos dermatológicos quando na verdade
fizeram depilações a laser. Este caso é só mais um a juntar a outros tantos,
uns conhecidos outros menos, e que revela bem a inglória fiscalização do
sistema. Se por um lado estamos a emagrecer a Saúde, com cortes de
recursos humanos e serviços, não podemos aceitar que, do outro lado da balança,
haja a delapidação em nome do luxo. Há pessoas a morrer por falta de assistência, como é o caso
de alguns doentes oncológicos. Há portugueses a adiar uma ida ao hospital, pelo
valor elevado das taxas moderadoras, pelo tempo de espera, enfim, por um
interminável peso que os deixa refém de um Estado já muito pouco social. Na última década, tem-se assistido a uma ruína progressiva de todo o “edifício”
da saúde pública em Portugal. Temo que actualmente se esteja na fase seguinte,
ou seja, na do enterro. Assistimos ao estrangulamento do sistema, a tentativas
claras de amputação de alguns dos seus segmentos mais sensíveis e a cortes
sérios em muitas das suas capacidades de resposta. Entretanto
há quem use o sistema para depilações a laser. O ministro da Saúde, Paulo
Macedo, um excelente gestor e bom a racionalizar problemas, não pode continuar
a fazer a vontade à Troika, sob pena de destruirmos uma das maiores conquistas
da liberdade. E tem urgentemente de olhar para aqueles que usam o Serviço de
Nacional de Saúde para roer ainda mais os esqueletos. Mais:
no fundo, os mesmos que defendem esta política também se afirmam grandes
defensores do Serviço Nacional de Saúde e muito preocupados com o seu futuro.
Só não sabemos onde pára essa preocupação. Nos hospitais portugueses é que não
será seguramente.
*Crónica de 17 de Fevereiro, Antena Livre, 89.7, Abrantes.
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