Des(acordos) e acordos que por aí lavram.
«A escrita é uma
convenção, que se pode alterar como e quando quisermos, sem que isso afete a
língua». A frase é de um conhecido linguista moçambicano e remonta a um texto
escrito a propósito das alterações ao Acordo Ortográfico de 1990. Lembrei-me dela para
falar do último acordo ortográfico de 2012 que, por cá, muita tinta e saliva
tem feito correr e que, legalmente, é obrigatório desde o passado dia 13. Não sou, desde o
início do processo, favorável à maioria das alterações que este novo acordo
ortográfico comporta. Contudo, pessoalmente, mesmo discordando, sinto-me na
obrigação de cumprir a lei, porque neste momento, falamos de uma lei, que é
geral e abstrata. E, na verdade, é disso que se trata. Os argumentos, de um
lado e de outro, são legítimos. Apesar de a evolução da língua ser um processo
natural, também é necessário ter em conta os argumentos contrários. Há palavras
que deixaram de fazer sentido, como o para e o pára, o ata do verbo atar e a
acta, documento escrito. Seja como for, e
apesar de não existirem consequências jurídicas, para quem como eu faz da
escrita o seu instrumento de trabalho, não me posso dar ao luxo, por vontade
própria, de cometer erros ortográficos. Porque neste momento quem escrever
segundo as regras do antigo acordo passa a dar erros ortográficos. Há 200 anos a Língua
Portuguesa tinha regras que, para nós, hoje seriam impensáveis. E também hoje
nós somos resistentes às regras e hábitos com os quais aprendemos e crescemos.
Apesar das incongruências, não há volta a dar, e também, confesso, ninguém
morre por isso. Por isso vos digo, não há convicções que resistam quando
lutamos com a lei. E para desgastes já bastam outros, de importância maior.
Também este
fim-de-semana, PSD e CDS consumaram a coligação pré-eleitoral que vai a votos
nas legislativas deste ano. É assustador perceber que o discurso da austeridade
é, a nível político, mais assertivo que o da verdadeira oposição, nomeadamente
de António Costa. E apesar de as
sondagens começarem a estar do lado do Largo do Rato é melhor que a esquerda
comece a ser mais firme no discurso ou, temo muito, que a coligação de direita
cavalgue e ganhe terreno de maior. O futuro e destino
deste país está nas mãos de um povo que tem sido duramente sacrificado. É na
mão dos cidadãos que está depositada a nossa esperança. Aconteça o que
acontecer será sempre uma escolha livre e democrática. E esta é a maior e mais
importante opção que um país nos pode dar.
*Crónica de 18 de Maio de 2015 na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.
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