Boys e girls: um dia a casa vem abaixo.
Portugal
continua a ser exímio nas cúpulas do poder. Seja com o PSD, CDS ou PS. Falo
destes três partidos porque apenas eles ocuparam o arco da governação em São
Bento. Em
causa estão as licenciaturas falsas, uma na câmara de Lisboa e outra no
ministério da Educação, e que o país ficou a conhecer na semana passada. Uma
situação que ataca todas as cores políticas. À
semelhança do que aconteceu no Governo de Pedro Passos Coelho, com Miguel
Relvas, o Executivo de António Costa já não se livra de fama e proveito iguais. Quando
um país elege cidadãos para o representar está também a eleger uma panóplia de
boys e girls que fazem carreira nas estruturas partidárias das várias forças
políticas. Homens
e mulheres que acabam em gabinetes a ganhar acima da média nacional e com
percursos dúbios pelo caminho. Portugal
é isto. Um país de títulos, onde ser doutor ou engenheiro é que conta para o
currículo. Não conta o mérito nem a experiência, importa apenas ser-se amigo de
A, B ou C, subir nas instituições sem esforço nem glória, e usufruir das
gamelas do Estado que, embora mais magras por estes tempos, mal ou bem, lá vão
aparecendo. Todos
os governos até hoje foram assim, com recheios de muitos favores que era
preciso pagar. É
por isso que já não surpreende os casos como os que foram públicos nos últimos
dias. Mas
isto simboliza igualmente aquilo que uma sociedade corporiza. Somos nós todos
que contribuímos para este estado de coisas. Porque votamos em pessoas que não
são de bem e que pensam apenas no seu umbigo. Que nos prometem mundos mil
quando esses proveitos são muitas vezes para satisfazer clientelas. Gente
que ajudou líderes a desbravar terreno nas duras campanhas eleitorais. Enquanto
isso, a nossa taxa de desemprego continua a contabilizar milhares. Pessoas de
carne e osso, sem um tostão, a passar dificuldades mas que, muitos deles, com
imensos sacrifícios tiraram um curso, andaram a queimar neurónios para poderem
ter uma bengala. O
mérito em Portugal, sobretudo na esfera da Administração Pública, é coisa de
tolos. Desde concursos públicos muitas vezes inglórios onde o selecionado já
está escolhido, às nomeações políticas. Entre uma coisa e outra, vai uma
panóplia de ascensões de que uma minoria beneficia. Pagos com o dinheiro
público. Um
dia a casa vem abaixo, e aí não há alicerce que resiste. E talvez seja mesmo
preciso um terramoto para o país se reerguer, limpando a podridão e exigindo
transparência.
Crónica de 31 de outubro, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.
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