Legislativas 2019: o jogo de forças parlamentares que se segue



Finalmente, António Costa vence as eleições com propriedade. Com a legitimidade (eleitoral e moral) precisa.

O resultado que terá esta noite valida-lhe essa moralidade com selo próprio, mas desta feita, para uma negociação diferente da de há quatro anos. Quanto mais não seja pela força e peso (diferentes) que PCP e BE conquistam nestas eleições.

Independentemente da repetição ou não da Geringonça, é quase certo que o Bloco já se bronzeia no areal do Largo do Rato, oferecendo a mão, o pé, a pele e a vender a alma ao Diabo, ofertas que em campanha eleitoral seriam blasfémia bloquista.

Não sabemos o que vai neste momento na cabeça de António Costa. Certamente muitas contas de somar (e diminuir também). Mas há uma memória que o líder do PS deve ter bem presente: a deslealdade de Catarina Martins no último debate televisivo e que deixou, claramente, o líder do PS muito zangado. Veremos se as facas da campanha terão efeito na hora de estender a mão.


Já Jerónimo de Sousa, que sai tremendamente fragilizado com os resultados desta noite, sabe melhor do que ninguém os custos de uma Geringonça nos mesmos moldes. Talvez por isso também tenha deixado claro que lá estará para “negociar medida a medida”. Não oferece nada, espera para ver. Talvez no calor da noite, seja o mal menor, já que é preciso juntar os cacos e erguer o orgulho ferido que tanta mossa faz no coração comunista. Estará a liderança de Jerónimo em causa? O Comité Central pode eventualmente começar a pensar que sim. O cansaço de muitos anos não ajuda e a idade de Jerónimo também não. 

À direita apenas uma certeza, expectável: Assunção Cristas chega ao fim de um caminho que, para ela, foi mais de espinhos que de rosas. A líder do CDS sai de cena, deixando um partido esfrangalhado. Nunca pensou provavelmente chegar aos miseráveis 4%, os mesmos que conferiram ao partido a fama de “partido do táxi”. 

Vai demorar a sarar feridas, num partido que há muito está em desmembramento. Resta saber se o Messias de Bruxelas estará disposto finalmente a salvar a honra do Caldas ou se Nuno Magalhães ou Pedro Mota Soares terão coragem para se fazerem ouvir mais alto. O Congresso Extraordinário que aí vem vai ser a hora “H” para um partido que terá necessariamente de se reencontrar. Se não o fizer corre sérios riscos de extinção.


Rui Rio é, como já sabíamos, outro grande derrotado da noite. Senão o maior por ser o adversário principal de Costa. Para quem o conhece, esta é uma derrota pesadíssima. Por culpa própria, que ninguém entende.  Nem ele, provavelmente. Defraudou  o espectro político do centro. Foi incapaz de provar que era uma verdadeira alternativa. Porém, Rio não perdeu estas eleições nas últimas três semanas, perdeu-as no último ano e meio. Nunca descolou e perdeu tempo demais a olhar para o umbigo deixando o partido à deriva no Parlamento. Sem norte nem regra. A indisciplina de alguns dirigentes e deputados e a sede de poder interna ajudaram a trilhar o desaire eleitoral desta noite. Dificilmente irá ocupar a liderança da bancada parlamentar e enfrentar o primeiro-ministro, cara a cara, na Assembleia da República. 

Resta saber se, à semelhança de Assunção Cristas, irá também abandonar o barco ou vai só convocar um Congresso para adiar (ainda mais) o pesadelo que reina na São Caetano à Lapa há muito tempo.

Nota ainda para o PAN que reforça a onda “verde” que André Silva tem trabalhado há muitos anos. Pode ser a chave de António Costa para fazer aprovar muitas leis no Parlamento. André Silva já disse, antes das eleições, que está disponível para negociar com Costa. Veremos se há namoro à vista ou se Costa prefere manter relações antigas.
Resta saber se (Rui Rio), à semelhança de Assunção Cristas, irá também abandonar o barco ou vai só convocar um Congresso para adiar (ainda mais) o pesadelo que reina na São Caetano à Lapa há muito tempo.
À hora a que escrevo ainda não é certo quais os partidos mais pequenos que estão a caminho do Parlamento (à exceção do Iniciativa Liberal, que chega ao hemiciclo com um resultado inédito). Em democracia, é certo que temos (e devemos) aceitar a pluralidade e aqueles que pensam diferente de nós. Mas, no caso do Chega, se se vier a confirmar este eventual resultado histórico, é um bom momento para refletirmos todos, no impacto que os discursos mais extremistas e populistas estão a ter na população. Na Europa, sabemos todos o que este fenómeno está a provocar. Em Portugal, é apenas um indício de que os cidadãos estão cansados da inércia dos partidos tradicionais e do sistema.

Quanto à abstenção, que dizer? Somos o reflexo das alternativas que temos. E continuo a achar que, só eles, políticos, podem mudar este tenebroso cenário de apatia eleitoral. Veremos se a renovação partidária e de quadros – que tarda em Portugal – conseguirá fazer esse milagre. 

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