Covid-19: os sem-abrigo



Para muitos – ou melhor para a maioria dos portugueses – entramos hoje na segunda semana de isolamento.

Por aqui a primeira não foi fácil, mas como em tudo na vida, a segunda será melhor, a terceira também, e assim sucessivamente, até nos habituarmos todos a este distanciamento de quase tudo, menos de nós próprios.

No meio de todo este caos, é importante lembrar que o País não suspendeu os problemas que já tinha: desde os apoios sociais às situações diárias de acidentes rodoviários, idas às urgências, portugueses que padecem de outras doenças, umas graves, outras menos, felizmente, sendo que muitos continuam a ser assistidos nos hospitais por outras causas de doença.

É importante dizer também que esta não é a hora de atacar ninguém, nem Governo, nem Presidente, nem instituições. Esta é a hora de todos apoiarmos o Estado português, de o motivarmos, porque, ao mesmo tempo que gere esta imensa e perturbadora crise, tem de continuar a tratar de todos nós, sobretudo dos que mais precisam. Porque o Estado não é apenas o Governo que nos lidera, o Estado somos todos nós. E este significado ganha, na espuma dos dias que correm, um significado num outrora visto.

Também por isso, e mais do que nunca, fez sentido o alerta do Presidente da República, que este fim de semana acompanhou o apoio aos sem-abrigo, em Lisboa.

É importante que as franjas mais débeis da sociedade continuem a ser apoiadas, na medida do possível. Estas pessoas, com o isolamento do resto da sociedade, ficam agora mais frágeis, sem ter onde pedir nem a quem pedir, porque tudo fechou, e nós, que passávamos por eles todos os dias, deixamos de lá passar.

Os sem-abrigo poderão eventualmente ter uma espécie de imunidade reforçada ante aquelas que são as agressões mais violentas a que, por natureza, já estão sujeitos.

Ainda assim é essencial continuar a alimentá-los, a dar-lhes uma palavra de conforto e a lembrá-los que, mais do que nunca, precisam abandonar a vida a que estão confinados.

O Estado pode falhar. E vai falhar. Mas o Estado tem a obrigação de proteger todos os portugueses. E estas pessoas são portugueses. E com eles é que não podemos mesmo falhar. Porque quando se falha com quem mais precisa não se entendeu nada do que é governar e auxiliar um país e os seus cidadãos num momento de aflição. 

*Crónica de 23 de março de 2020, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR

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