«De certo modo, nenhum de nós sobreviveu a Auschwitz».


Clara Ferreira Alves, uma jornalista e mulher brilhantes, que admiro e leio há anos, escreveu um texto esta semana que nos coloca num patamar de dor, sofrimento e reflexão a um nível que, no dia-a-dia não estamos habituados. Daquela maneira simples, bela e tão sincera, a Clara desnuda-se, partilhando com o leitor as suas emoções sobre os campos, o Holocausto, os frios caminhos do fim de tantos milhões. Cada palavra da Pluma Caprichosa do passado fim-de-semana, no Expresso, é uma espada. E é impossível alguém ler este texto, intitulado ‘Nos Campos’, e ficar indiferente. Já o li cinco vezes. E continuarei a lê-lo quantas vezes forem necessárias para ter a certeza do que sinto quando confrontada com testemunhos assim. Deixo algumas passagens.

«Em Auschwitz não sabemos quem somos, nem de onde vimos, nem para onde vamos, sobrepõe-se a esta solidão, inevitavelmente, uma ausência de sentido que só pode ser preenchida pelo desgosto»

«Pensamos que estamos preparados para aquele momento, para a realidade, e descobrimos, como dizia T.S. Eliot, que não suportamos demasiada realidade. Não há muito que se possa escrever sobre os campos que não tenha sido escrito. Como inscrever na nossa consciência o extermínio mecânico de seres humanos?»

«Auschwitz é luto. E é o lugar mais triste do mundo. Não é só a tristeza da paisagem, as lâmpadas lúgubres, o letreiro ignóbil, o arame farpado, a fileira das casernas, o corredor de hospital, o instrumento cirúrgico das experiências médicas, os cabelos das vítimas, os dentes das vítimas, os sapatos das vítimas, as caras das vítimas. Os objectos. Os derradeiros sorrisos. A selecção. A desumanização. O duche. O túnel do crematório. O encarceramento. Dois mil gaseados em vinte minutos. E a orquestra continuava a tocar.´

«De certo modo, nenhum de nós sobreviveu a Auschwitz»

«Uma visita a Auschwitz devia fazer parte do currículo da educação europeia. Um dia destes, não sobrará um sobrevivente. Um desses velhos de olhos macerados que setenta anos depois continuam espantados por estarem vivos e que foram as crianças de Auschwitz».

Obrigada Clara por dares um grito colectivo.


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