Do El Dorado às contas de lixo
Com a crise que se abateu em Portugal nos últimos anos e o
desemprego enorme que bateu à porta de muitos portugueses, Angola tornou-se, em
pouco tempo, o destino ideal para milhares. Bons ordenados, ajudas de custo e em muitos casos casa paga. Ao
contrário, em Portugal, salários miseráveis, desemprego e desespero. Muitos portugueses procuravam uma vida melhor em Angola, mais
desafogada, mas de repente tudo mudou. A desvalorização do petróleo e a crise
cambial aí estão com milhares de emigrantes portugueses a deixaram de receber
em dólares e a receberem agora em Kwanzas, levando à perda real de muitos
salários dourados. Como muitos já dizem, passaram de contas de luxo para contas de
lixo. As famílias em Portugal com contas para pagar, desesperam.
O dinheiro já não chega a rodos de Luanda. Os
bancos não têm dólares e as empresas estão sem dinheiro para pagar a
trabalhadores e fornecedores. A juntar a tudo isto, a linha de crédito criada
pelo Governo de Passos Coelho para apoiar a tesouraria das empresas nacionais
que trabalham com Angola deverá ser abandonada por não ter sido utilizada no
último ano, sobretudo devido a problemas burocráticos. Esta linha, inicialmente com 500 milhões de euros e que depois
passaram a 100 milhões, foi estabelecida pelo Governo português com os bancos,
em abril de 2015, para reforço da tesouraria destas empresas, face às
dificuldades conjunturais em Angola com a crise do petróleo, mas demorou alguns
meses para ficar operacional. Resultado? Muitos empresários não chegaram a
recorrer a esta ajuda. Agora, o Governo de António Costa está a estudar o lançamento,
ainda este ano, de uma outra linha de crédito que permita regularizar os 160
milhões de euros de salários que há vários meses os trabalhadores portugueses
em Angola não conseguem repatriar. É uma ajuda e pode ser bem-vinda para
milhares de portugueses. O que é lamentável, no meio deste turbilhão de problemas, que
está a fazer mossa na economia portuguesa também, é a lentidão com que o Estado
executa anúncios e ajudas. Os problemas reais das pessoas não são compatíveis com o tempo
administrativo. E este, caros ouvintes, continua a ser um dos maiores cancros
da Administração portuguesa. A eficiência, competitividade e sustentabilidade dos dinheiros
públicos também é isto: execução eficaz das medidas e impacto real na vida dos
seus cidadãos. Enquanto o Estado e os seus dirigentes não perceberem isto
continuaremos à mercê de nós mesmos.
*Crónica de 25 de julho, na Antena Livre, 89.7 Abrantes. OUVIR.
Comentários