Portugal: às vezes, um país bipolar
Foto: Filipe Farinha | Lusa |
Portugal é um país bipolar.
Em várias matérias, mas nesta crónica não podia deixar de falar de uma em
particular, que me incomodou durante toda a semana que passou.
Falo do incêndio de Monchique
e da polémica que se instalou sobre a forma como a GNR retirou muitas pessoas
das suas casas, com a iminente chegada do fogo.
Depois do que aconteceu em
2017, e que o país, tristemente, jamais esquecerá, não consigo entender porque
se atiram sacos de pedras ao facto de muitas pessoas, contra a sua vontade,
terem sido retiradas das suas casas.
O direito constitucional à
propriedade privada vale zero ante mais ínfima possibilidade de uma perda
humana.
Sabemos que o Estado passou
do 8 ao 80 na forma como encara hoje os fogos florestais e a segurança das
pessoas nestas circunstâncias.
Vi inúmeras pessoas, em
reportagens e nas redes sociais, a manifestarem-se veemente contra o que se
passou em Monchique. E continuo chocada.
É nisto que Portugal é, em
certa medida, um país bipolar. Se, porventura, acontecesse uma tragédia em
Monchique, não duvido que os mesmos que hoje criticam a ação musculada da GNR
estariam a apontar o dedo acusador ao Estado por não ter protegido as pessoas.
Quanto a mim, agradeço o que
vi. Se fossem os meus, teria agradecido que os tivessem retirado de casa, à
força, e contra a sua legítima vontade de proteger o que é deles.
O suor de uma vida inteira
perdido em minutos e resumido a cinzas é das dores mais profundas da vida de um
ser humano. Mas a dor de perder um ente querido, essa, esventra qualquer outra
dor.
É por isso que espero que
Portugal tenha aprendido com as mortes de 2017. Nada, mas mesmo nada, vale uma
vida humana.
Crónica desta segunda-feira, 13 de agosto, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR.
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