Crónica de um apagão numa aldeia do Interior

Segunda-feira. 28 de Abril de 2025. O País viveu um dia difícil, talvez um dos piores, mais até do que na pandemia. 

Foto: Ana Clara

Nas grandes cidades, onde dependemos todos da eletricidade e comunicações, ficamos todos sem chão, sem saber o que fazer, perdidos, numa escuridão sem fim. Para quem, como eu, viveu as duas Eras - com e sem telemóveis com e sem internet - admito que possa ter sido mais fácil. Tive até uma tarde onde imperou a conversa, à mesa de um café, com amigos, e até as arcas frigoríficas aguentarem o frio. À minha volta, vi crianças perdidas, no olhar, no corpo, na vida. Depois, vi-os a conviver, a jogar à bola, sem ecrãs nas mãos. A eletricidade voltou e rapidamente o medo passou. 

Mas, em contraponto, tive um testemunho de quem, lá longe, no interior, numa aldeia recôndita deste País, tudo permanecia igual. Não fosse a falta de luz (e até essa parece ter sido normal), ninguém daria conta do caos que se vivia de norte a sul. Idosos, a maioria, seguiram as suas vidas, na agricultura de subsistência de que vivem diariamente, sem telemóveis, sem Internet, sem comunicações. Uns souberam muito tarde, porque as suas vidas são completamente diferentes das urbanas. Outros, espantavam-se com as notícias ao fim do dia, de boca em boca, à moda antiga. Tiveram um dia sereno. Igual a todos os outros, sem dramas nem desvarios de que o fim do mundo vinha aí. Não precisaram de correr, quais loucos, aos supermercados, porque ali, naquela aldeia que não importa ao poder nem aos urbanos, a comida não escasseia, a água corre na fonte comunitária e as redes sociais das suas vidas confluem no banco comunitário, onde todos se juntam ao fim do dia para partilhar dores e maleitas da vida. Um dia vamos ter arrependimento pelas escolhas que fazemos em certos momentos. 

Se é certo que somos reféns do caminho tecnológico, também não é menos verdade, que o equilíbrio será sempre seguramente a escolha mais acertada das nossas vidas. O problema é que somos vítimas das nossas próprias escolhas. Lá longe, no ínfimo de Portugal, quantas aldeias e quantos portugueses estão mais capacitados que outros para resistir a uma crise nacional e internacional? Quase todos. Se isso é bom ou mau não sei. Sei apenas que é, seguramente, mais saudável e mais seguro.

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